O que sabemos e podemos constatar em nossa prática clínica com pacientes acometidos com dor crônica é o fato de que estes frequentemente apresentam alterações cognitivas. Déficits de memória, dificuldades na capacidade de atenção e concentração e redução do tempo de resposta em tomadas de decisões simples são encontradas com muita frequência. A memória que aponta déficit até então é a memoria de curto prazo. O que se pode afirmar é que o processo de como a dor a afeta a memória ainda é pouco conhecido.
Muitas são as questões, hipóteses e variáveis levantadas que podem estar contribuindo para esses prejuízos cognitivos: o processo de dor em si, medicamentos, qualidade do sono, alterações do humor, estados emocionais como stress, depressão e ansiedade. É importante ressaltar que, estes estados emocionais citados têm sido reconhecidos como importantes moduladores da manifestação de síndromes dolorosas, mas, estudos mostram também que aspectos cognitivos e estratégias de enfrentamento têm mostrado influencia sobre a resposta de dor.
Temos respostas definitivas? Ainda não, mas pesquisas e estudos apontam alguns direcionamentos importantes tais como o distresse (stress) emocional que frequentemente acompanha a dor crônica. Essa junção traz muitos sentimentos negativos que levam o paciente em caminho a depressão. Na depressão é importante relatar que além das alterações cognitivas negativas de pensamentos e emoções, ocorre também uma disfunção química. Há o aumento no nível de cortisol levando a uma modificação da atividade química e outras consequências que acabam por afetar o desempenho cognitivo do sujeito. Na ansiedade a capacidade de concentração, que é fundamental para a retenção de informações, fica prejudicada.
Há também o pressuposto de que a dor é um estímulo capaz de afetar o estado dinâmico do cérebro, ou seja, a dor ativa sistemas que também são responsáveis pelo processamento da atividade da memória. Sendo assim, pode-se levantar que se a dor altera a dinâmica do cérebro, há uma explicação para os déficits cognitivos.
Em outros estudos levanta-se ainda a hipótese de que em quadros de dor crônica se estabelece um novo padrão neural, onde o sistema nervoso central é danificado estabelecendo então um padrão próprio de dor crônica, levando os estudiosos a pensar na possibilidade de uma nova adaptação neural que podem estar provocando alterações das funções cognitivas.
Uma pesquisa mais recente da equipe do Instituo Molecular e Celular (IBMC) e da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto observou que o processo de dor crônica provoca alterações no funcionamento cerebral que não estão diretamente ligados ao processamento doloroso. Fala ainda que os circuitos neurais relacionados ao processamento de memórias e moções também são afetados.
O que podemos afirmar é que ainda temos um caminho longo a percorrer no que tange ao entendimento das relações sobre memória e dor.
Tatianna Rangel Coutinho
Psicóloga Cognitivo-Comporamental e pós-graduada em Psicologia Hospitalar.
Referencias de leitura: